Por Bruna Batista - 21 maio 2020 - 8 min
Vivemos um momento único, atípico e incerto. O mundo como conhecemos, precisa estar diferente para cuidarmos uns dos outros. Algumas instituições de ensino suspenderam suas aulas, outras adiantaram as férias e algumas aderiram ao regime remoto de aulas. Aqueles que podem, estão realizando seu trabalho de casa. Quem precisa sair, deve utilizar máscaras além de tomar outros cuidados. Com essa nova realidade que se apresenta, você já pensou o que os livros podem nos ensinar sobre este momento?
Esse foi o tema da live apresentada pelo Coletivo Leitor, em parceria com a par Plataforma Educacional. O encontro online foi também o lançamento da par Literatura, uma plataforma que conecta a literatura ao processo pedagógico. Conheça mais sobre a par Plataforma Educacional.
O evento contou com as participações de Ricardo Azevedo, que é escritor, ilustrador e doutor em Letras pela Universidade de São Paulo, e Denise Viotto, idealizadora da “A Taba”, empresa especializada em curadoria de livros infantis e juvenis, e mestre em Educação.
A mediação da conversa foi feita por Carolina Tresolavy, líder da unidade de negócio em Literatura Infantojuvenil da SOMOS Educação, e Fábio Weintraub, doutor em Letras pela USP, editor, poeta e Gerente de Literatura Infantojuvenil da SOMOS Educação.
Confira nesse post algumas das questões discutidas no encontro!
O momento pelo qual estamos passando é marcado por muitas crises – sanitária, econômica, política, social. Há incertezas a respeito do futuro, quando as coisas voltarão ao normal. A realidade pós-pandemia será diferente daquela em que vivíamos antes. Estamos atravessando a nado um rio difícil, sem saber quando chegaremos ao outro lado e nem como ele será. Nas palavras de João Guimarães Rosa, em “Grande Sertão: Veredas”:
“A gente quer passar um rio a nado, e passa; mas vai dar na outra banda é num ponto muito mais embaixo, bem diverso do em que primeiro se pensou. Viver nem não é muito perigoso?”
São questões importantes e difíceis para as quais, infelizmente, não temos respostas. A maior parte dos planos que temos para o futuro estão suspensos, sem previsão de retomada. Nas escolas, alguns alunos contam com o privilégio de poder continuar suas aulas com o material online. Para outros, resta a incerteza de não saber quando voltarão a aprender. Para todos eles, entretanto, o contato e a socialização na escola já não existem mais – e fazem falta.
Neste momento, a arte, em suas diversas formas, pode ser um refúgio, um lugar para encontrar uma certa tranquilidade. Para aqueles que tem acesso à literatura em casa, essa pode ser uma oportunidade para aproveitar a introspeção que os livros literários proporcionam. É o que pontua o autor Ricardo Azevedo na live.
Conforme expõe Ricardo, os livros literários, ao contrário dos didáticos e técnicos, podem ser explicados pela descrição. Quem escreve o livro, descreve a história de alguém ou alguma coisa, e essa descrição implica em uma interpretação. Cada um de nós faz a sua própria leitura sobre o que foi contado. A produção, portanto, tem um caráter subjetivo, onde os temas trabalhados não podem ser propriamente ensinados ou descritos, no máximo podemos compartilhar essas vivências. A literatura, então, nos proporciona a riqueza da diversidade.
A leitura, nesse sentido, desperta em nós dúvidas, questionamentos, tensões e desconfortos para trabalhar uma nova compreensão de nós e do outro. Questionamos para entender. Denise Viotto ressalta que a literatura não é um remédio, mas um escape que nos permite entrar em contato com a nossa subjetividade.
A ciência é nossa guia nesse momento. Ela é objetiva, direta. Precisamos lavar as mãos e ficar em casa, nos cuidar para cuidar dos outros, ter atenção, higienizarmos os itens que chegam da rua. Entretanto, essa objetividade não alimenta nosso âmago. Precisamos de arte, de um substrato criativo que nos conecte enquanto pessoas e seres sentimentais. As páginas dos livros nos possibilitam esse diálogo com o outro, com um mundo diferente; e também um mergulho para dentro de nós.
O mergulho para dentro que os livros proporcionam, nos dá capacidade para entender melhor quem somos. Não se trata de uma forma de terapia ou autoajuda, mas de uma compreensão maior sobre nós mesmos. Em um mundo de informações a cada minuto, rapidez e experiências rasas, tem um significado muito grande ter tempo para dar esse mergulho.
Com a literatura, entendemos melhor o que é a experiência humana e toda sua diversidade. Ela nos proporciona ter contato com o diferente, o que está além do que poderíamos perceber sozinhos. E isso nos forma enquanto seres humanos, enquanto cidadãos pertencentes a uma sociedade. E é por isso que, como contou Denise Viotto, o que lemos nos torna quem somos. A história de cada um tem grande influência dos livros que lê.
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo tupi.Juca Pirama-I – Gonçalves Dias
A leitura é importante desde a infância por ativar essa possibilidade de compreensão de si e do outro desde cedo. O contato com o novo, com o diverso, nos torna mais tolerantes e abertos à experiências que não estamos acostumados. Nos inspiramos na estória de persistência do herói para sermos persistentes na nossa própria história. Entendemos melhor a vida e a cultura de quem não está fisicamente perto de nós.
Ricardo Azevedo conta que quando criança, o pai reunia os filhos para gravá-los recitando trovas populares e poemas. Cada um dos irmãos lia um trecho, e o pai participava com eles. Não parecia uma lição ou uma obrigação. Era um momento de diversão com a literatura e havia a alegria de fazer algo juntos, repetir, ouvir de novo.
Portanto, o tempo em casa, com os filhos, pode ser aproveitado para formar uma nova conexão, mais forte, seja compartilhando histórias da família ou lendo algum livro para os filhos. Ensinar o hábito da leitura pode ser divertido, uma forma de união e de criação de novos vínculos. E, além disso, é um momento de união e carinho, fundamental para tempos tão conturbados.
Pais que não tem o hábito da leitura podem aproveitar para desenvolvê-lo, lendo com seus filhos. As crianças pequenas podem ouvir as histórias, despertando nelas o interesse pelo mundo das narrativas. A literatura nos proporciona um mundo de possibilidades. E a leitura, além de auxiliar o desenvolvimento cognitivo, também proporciona um tipo de cura para momentos tão difíceis.
Acesse nosso material “4 semanas de diversão com livros” e veja dicas de atividades de leitura para fazer com as crianças!